Discriminação na Kartoffelfest

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Foto de divulgação da Kartoffelfest, publicada no site da prefeitura: www.santamariadoherval.rs.gov.br/kartoffelfest/‎

Discriminação na Kartoffelfest

20.05.2010Picture. É sempre com grande alegria que visito minha terra natal. É uma ótima oportunidade para celebrar, ver a família e os grandes amigos que ficaram para trás. Sinto orgulho do lugar onde passei minha infância, o Speckhof, também conhecido como Boa Vista do Herval. No último dia 16 de maio mais uma vez voltei de férias para lá e obviamente fui participar da grande e já tradicional Kartoffelfest, a Festa da Batata. O Herval, assim como várias outras comunidades de origem alemã, italiana ou japonesa do interior do Rio Grande do Sul, é fascinante e único. Lá há o que chamamos de bilingüismo, ou seja, as pessoas falam, ao mesmo tempo, a língua dos seus antepassados e o Português, a nossa língua nacional. As línguas não são só formas de comunicação, elas são muito mais; elas carregam consigo toda uma história e a cultura das pessoas que as falam. Se uma língua deixa de ser falada, é como se a cultura que ela carrega consigo fosse dizimada. Há coisas, p.ex., que sabemos expressar tão bem no dialeto do Hunsrück falado no Herval e que não podem ser ditas com a mesma precisão em Português. O mesmo acontece com qualquer língua: cada uma possui características que são só suas.

Por muito tempo, especialmente depois da política discriminatória iniciada por Getúlio Vargas, absurdamente proibindo o uso, p.ex., da Bíblia ou de hinários de igreja em alemão, os dialetos e outras línguas faladas no Brasil foram proibidos, teoricamente não podiam ser falados, oficialmente não podiam ser ensinados nas escolas. Isto representou uma “involução”, uma espécie de apologia à “mono-cultura”.

E por muito tempo as coisas não foram diferentes no Herval: falar Alemão ou Português com sotaque era visto como coisa de “colonos”, considerados pessoas ignorantes, ou seja, havia uma inversão absurda de valores. Só falar Português era visto como correto, falar outras línguas era coisa de gente mal instruída. Mal sabem os que riam das pessoas bilíngües que há muito mais lá fora e que saber falar duas, três, quatro línguas é uma excelente vantagem no mundo competitivo de hoje. Um dos pontos altos deste absurdo intelectual foi a tentativa de um ex-prefeito do Herval de querer proibir os alunos de falarem o Alemão, a língua-mãe deles, nos intervalos das aulas (conforme reportagem da ZH de 26.06.1989). O artigo dizia que o ex-prefeito pretendia “coibir” o uso de Hunsrück nas escolas, dando orientação para que os alunos fossem ameaçados com castigos, caso não cumprissem com a determinação. Aquilo nada mais representava que a tentativa de anular a cultura de um povo. Para minha surpresa, mesmo no ano de 2010, deparo-me com mais um episódio lamentável, como o citado acima, na Kartoffelfest. Segundo relatos de pessoas presentes à festa, um dos jovens integrantes do POE (Policiamento de Operações Especiais), com armas pesadas em punho, resolveu chamar a atenção de um casal de idosos que conversava alegremente em Alemão, pedindo para que estes “falassem direito”, tudo isto em uma festa que carrega em seu próprio nome a celebração cultural de uma comunidade. Aparentemente o episódio exigiu, inclusive, a intervenção louvável do atual prefeito junto ao POE, solicitando que estes se ocupassem somente de sua tarefa, a segurança do local da festa. Sugiro ao comandante do POE que instrua seus comandados, pedindo para que estes deixem a arrogância e a aparente falta de compreensão cultural de lado e, pelo menos, cumpram o que diz nossa lei máxima no país, a Constituição Federal, a fim de não discriminarem cidadãos de bem. Isto está previsto nos artigos 3º, Parágrafo IV e 5º, Parágrafo IX, que proíbem quaisquer tipos de discriminação e a livre expressão de comunicação, entre outros direitos.

Além do mais, há um agravante neste caso, pois subjacente está a discriminação intelectual ainda hoje imposta aos falantes de duas ou mais línguas em nossas terras. Nós, os hervalenses bilíngues, não temos culpa e não condenamos ninguém por falar uma só língua, mas exigimos respeito por nossa cultura e língua. Aliás, muitos daqueles que frequentemente criticam os “colonões” ou os “alemães-batata” – expressões que já ouvi muitas vezes da boca de alguns que pensam estar em um nível superior, pois se sentem parte “da cidade” e “civilizados” – lamentavelmente nem sequer conseguem falar corretamente a variedade padrão da única língua que sabem.

Só para citar dois exemplos, na Europa de hoje é quase impossível ser competitivo profissionalmente quando se fala uma só língua. Em Aruba, Bonaire e Curaçao, as Ilhas ABC do Caribe, quase todos os cidadãos sabem falar quatro línguas paralelamente: Holandês, Papiamentu, Inglês e Espanhol. E alguns entre nós ainda querem coibir o Alemão Hunsrück falado em nosso meio. Não são lamentáveis atitudes deste tipo?

Nós deveríamos ter orgulho da nossa cultura e das línguas faladas em nossas comunidades. Se esquecermos do passado, deixaremos de ser quem somos.

Os casos acima ilustram a velha história de querer rir de quem se dedica ao conhecimento e vive a multiculturalidade. O mundo já mostrou e continua a mostrar que a ignorância faz de nós, os eternos subjugados. Quanto mais tentarmos “apagar” nosso passado, seja ele de origem africana, europeia, indígena, árabe ou asiática, tanto mais eliminaremos aquilo que nos torna nós mesmos, aquilo que somos hoje. Quanto mais soubermos, melhor para nós e para o país. Quanto mais discriminarmos, mais nós mesmos nos afundaremos na ignorância. Simples assim.

 * Marco Aurelio Schaumloeffel é professor de Alemão, Português e Linguística. Atualmente leciona Português, Cultura Brasileira e Cinema Brasileiro em Inglês na University of the West Indies, em Barbados, no Caribe. Ele elaborou a sua dissertação de mestrado em Linguística pela UFPR sobre o dialeto Hunsrück falado em Boa Vista do Herval.


Source: Marco

History of the Tabom, the Afro-Brazilian community in Ghana

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Chapter in Book

SCHAUMLOEFFEL, Marco Aurelio. History of the Tabom, the Afro-Brazilian community in Ghana. In: Kwesi Kwaa Prah. (Org.). Back to Africa. Afro-Brazilian Returnees and their communities. 1ed. Cape Town: The Centre for Advanced Studies of African Society (CASAS), 2009, v. 1, p. 159-172.

Möglichkeiten und Grenzen des Computereinsatzes in brasilianischen Schulen

Book – German
Möglichkeiten und Grenzen des Computereinsatzes in brasilianischen Schulen
Möglichkeiten Und Grenzen Des Computereinsatzes In Brasilianischen SchulenDieses Buch analysiert die Möglichkeiten und die Grenzen des Computereinsatzes in Schulen, spezifisch im Bereich Deutsch als Fremdsprache.
ISBN 1-44046031-0   EAN 978-1440460319
Publication Date: Mar 30 2009
Page Count: 76
Categories: Language Arts & Disciplines / Linguistic

Tabom. The Afro-Brazilian Community in Ghana

Book

Tabom. The Afro-Brazilian Community in Ghana
Marco Aurelio Schaumloeffel

Tabom. The Afro-Brazilian Community In GhanaThe first book on the History of the Tabom, the community of the Afro-Brazilian returnees in Ghana. They returned to Ghana from Bahia between 1829 – 1836. “This book seems to be small, but has many doors, as if it were a mansion. They lead to several and different sceneries and let us see, first, in tail-coat and top-hat, and later wrapped in a beautiful kenté cloth, the human beings who filled them and whose stories the Tabom of today repeat by heart. If in its pages we learnt a lot about the Tabom People, thanks to the accuracy and the intelligence with which Marco A. Schaumloeffel listened and read, they demand from us, that we learn more.” (Alberto da Costa e Silva).
ISBN 1440460655 EAN 978-1440460654

You can find the book here: Tabom. The Afro-Brazilian Community in Ghana

Interferenz des Portugiesischen im deutschen Dialekt von Boa Vista do Herval, Rio Grande do Sul

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Artikel in den Tagungsakten des VI. Brasilianischen Deutschlehrerkongresses und des I. Lateinamerikanischen Deutschlehrerkongresses, São Paulo, Brasilien, 27.07.2006

“Deutsch in Südamerika: Neue Wege – Neue Perspektiven”

Inhaltsverzeichnis: http://www.abrapa.org.br/cd/beitrage.htm

Artikel
SCHAUMLOEFFEL, Marco Aurelio. Interferenz des Portugiesischen im deutschen Dialekt von Boa Vista do Herval, Rio Grande do Sul. In: I Congresso Latino-Americano de Professores de Alemão & VI Congresso Brasileiro de Professores de Alemão, 2006, São Paulo, Brasil. Tagungsakten des VI. Brasilianischen Deutschlehrerkongresses. São Paulo: Abrapa, 2006

http://www.schaumloeffel.net/textos/interferenz.pdf


Source: Marco

Empréstimos lingüísticos do português nas línguas faladas no País dos Tabons

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Artigo publicado:

Schaumloeffel, Marco Aurelio. Empréstimos lingüísticos do português nas línguas faladas no País dos Tabons. Palavras (Lisboa), v. 34, p. 47-60, 2008.

Interferência do Português em um Dialeto Alemão Falado no Sul do Brasil

Book – Portuguese and Hunsrückisch

Português/Hunsrückisch
Interferência do Português em um Dialeto Alemão Falado no Sul do Brasil

Este livro descreve e analisa o estado atual do dialeto Hunsrück de Boa Vista do Herval (DBVH), uma pequena comunidade no RS, Brasil (20km de Gramado). Os dados apresentados baseiam-se em transcrições de quase 20 horas de gravações com 36 falantes, selecionados segundo critérios sociolingüísticos. O ponto central é a análise das interferências do português no DBVH, tanto no âmbito gramatical (gênero, verbos, formação de plural etc.) quanto no lexical-semântico (palavras de várias áreas: família, cozinha, profissões, tecnologia etc.).
ISBN: 978-1-4303-0725-9

Este livro pode ser encontrado aqui:

Interferência do Português em um Dialeto Alemão Falado no Sul do Brasil

O Dialeto Hunsrück de Boa Vista do Herval: materiais complementares (transcrições, tabelas, fotos etc.).

Interference of Portuguese in a German Dialect spoken in Southern Brazil – Hunsrückisch is spoken by the bilingual community of Boa Vista do Herval (BVH), situated in Southern State of Rio Grande do Sul and composed by descendants of Germans who immigrated to Brazil almost 180 years ago. The book draws the historic and sociolinguistic profile of BVH, describes some aspects of its Hunsrückisch, and studies the grammatical, lexical and semantic interferences of Portuguese.

The Ghana Blog

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The Ghana Blog – setembro de 2003 a julho de 2005.

Blog com fotos e as experiências vividas no Gana nos dois anos em que moramos lá.


Source: Marco

A Massai Branca

Translation

A Massai Branca

PictureSaiu há alguns dias pela editora Ediouro/Geração o romance “A Massai Branca” (Die weiße Massai), que traduzi do alemão para o português. A experiência foi interessante, interessante também tentar entender a cabeça de quem publica, quase que eu teria de assumir em meu nome um título ridículo, algo como “Tão perto, tão longe”, para fazer jus ao gosto do brasileiro, acostumado com pouca leitura e muita novelas da Globo. Eu sempre achava curioso como que filmes com um título simples no original pudessem ser tão desvirtuados em português, algo que quase beira a comédia. Agora entendo como isto ocorre, pois aconteceu algo semelhante na hora da definição do título deste romance da suíça Corinne Hofmann. Ainda bem que o bom senso prevaleceu. Mesmo assim tiveram de tascar um subtítulo, não agüentaram (sinto muito, mas não posso assumir a responsabilidade…), o sentimentalismo do brasileiro teve de ser explorado, vejam que romântico: “A Massai Branca. Meu caso de amor com um guerreiro africano” (ISBN 9788560302024). Muito melhor, não? Soa mais “bonitinho”. Se alguém tiver interesse em ler e me dar um retorno mais tarde, eu muito agradeceria. Aqui as notas de tradução que escrevi para o romance:

Breves notas do tradutor
Vários termos usados nesta história baseada em fatos, típicos do ambiente onde ela se desenrola, parecem estranhos à primeira vista, tanto que não é possível encontrá-los em dicionários e enciclopédias de língua portuguesa. Todavia eles são automaticamente clarificados ao longo da narrativa através do contexto, como é o caso da própria palavra “massai” e de outras, tais como “moran” (guerreiro), “matatu” (perua, van, táxi coletivo) e “maniata”. No caso de “maniata”, por exemplo, haveria equivalentes em português, porém todos imprecisos para descrever este tipo de moradia massai singular, tanto que optei pela incorporação do termo original, assim como a própria autora já o fizera no alemão. “Massai” ainda não é um termo consagrado em português, mesmo em inglês, uma das línguas usada no Quênia, há variações: maasai ou masai. Em alemão e em português é necessário usar o “ss” para não alterar a pronúncia do termo. Mas também poder-se-ia cogitar o uso de “ç”, assim como já acontece em “Mombaça” (“Mombasa” em inglês). Como há uma localidade no Rio de Janeiro denominada “Maçai” e o nome de Maceió deve sua origem ao “maçai” do tupi (“maçayó” ou “maçai-ok”, “aquilo que tapa/cobre o alagadiço/o mangue”), preferi “massai”, a fim de fazer a diferenciação.
Também por fidelidade ao uso e estilo da autora, usei alternadamente “chá” e “chai”, sempre que foram usados, respectivamente, os termos “Tee” e “Chai” no original em alemão. O mesmo ocorre em alguns diálogos simples, importantes para a ambientação, usados em inglês no meio da narrativa em alemão. Inclusive há erros propositais neles, mostrando o parco conhecimento inicial do idioma, tanto por parte de Corinne quanto de Lketinga. Uma tradução destes fragmentos em inglês faria com que vários elementos extratextuais constantes na narrativa fossem perdidos. A alternância entre o uso de linguagem mais formal em alguns trechos do original e de linguagem informal em outros foi igualmente observada na tradução.
Por fim, é curioso observar que etimologicamente a palavra “Kral”, freqüentemente usada em alemão no original, também existente em inglês (“kraal”), adotada nestas línguas a partir africâner (“craal”), tenha a sua origem no português (“curral”). A presença lusa na África meridional possibilitou a incorporação do termo ao africâner. Diferentemente do português, “Kral” e “kraal” podem significar não só “curral”, mas também “vilarejo de nativos sul-africanos”. É exatamente isto que faz as línguas serem tesouros fascinantes. Boa leitura!

Barbados, Índias Ocidentais, agosto de 2006.
Marco Aurelio Schaumloeffel

Outras fontes:
http://www.geracaobooks.com.br/releases/massai_release.html
http://vergostarler.blogspot.com.br/2013/01/a-massai-branca-meu-caso-de-amor-com-um.html
http://thebarbadosblog.blogspot.com.br/2007/04/massai-branca.html

 

Atitudes ambientais em Barbados.

Artigo publicado:
SCHAUMLOEFFEL, Marco Aurelio. Atitudes ambientais em Barbados. Revista Qualitá Socioambiental, Curitiba- PR, p. 58, 01 set. 2006

Atitudes ambientais em Barbados

Marco Aurelio Schaumloeffel*

Em Barbados, nas Índias Ocidentais, uma pequena ilha do Caribe com cerca de 270.000 habitantes e 0,5 km² menor que a ilha de Santa Catarina, a preocupação com o meio-ambiente é intensa. Vários fatores concorrem para que a atitude do governo e da população seja em prol da preservação e melhoria do meio em que vivemos. Alguns deles também são verificáveis no Brasil, outros seriam de fácil implantação, enquanto que outros poucos exigiriam um esforço mais amplo e mudanças de longo prazo para que se efetivassem. Nas próximas linhas estão algumas amostras esparsas disto.

Causa boa impressão passear pelas ruas da capital Bridgetown e de outros distritos. Elas têm um aspecto bastante limpo, mesmo que algumas vezes seja possível ver copos descartáveis e outros tipos de embalagens, mas lixo espalhado na rua não é regra. Perto de lanchonetes que oferecem junk food, há maior incidência de junk people e maior chance de haver lixo depositado em lugares impróprios. O principal fator que faz as pessoas terem consciência de que não é nada agradável nem higiênico conviver com o lixo espalhado pela cidade é o nível de educação: mais de 98% da população é alfabetizada, o que faz, claro que não automaticamente, mas como uma conditio sine qua non, com que a qualidade de vida (nela se inclui a consciência ambiental) e a renda per capita sejam altas. A educação é uma das causas e não a conseqüência de boa qualidade de vida e de bom nível de renda. Pelos dados da ONU, Barbados está em 30° lugar no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), o melhor entre os países considerados em desenvolvimento, enquanto que o Brasil está em  36°. Mesmo o município com o melhor IDH no Brasil, São Caetano do Sul (SP), tem um índice menor do que Barbados; já o pior, Manari (PE), equipara-se ao nível dos últimos países da lista. O índice de alfabetização relativamente baixo do Brasil, porém, não exime de culpa quem teve educação e tem consciência de como poderia agir, mas mesmo assim insiste em jogar aquela latinha de cerveja pela janela do carro ou todo dia usa 5 copos descartáveis de plástico para tomar cafezinho no escritório, quando poderia usar sua xícara pessoal, que, claro, é menos prática e tem de ser lavada.

Uma das coisas que funciona muito bem aqui e que desandou no Brasil, embora também funcionasse há pouco mais de uma década, é a devolução de garrafas vazias. Por comodidade, optou-se por quase que exclusivamente fazer e comprar garrafas pet, que causam inúmeros danos ao meio-ambiente, latinhas e embalagens tetra pak. Aqui todas as garrafas, sejam de plástico ou de vidro, sejam grandes ou long neck, são recolhidas e reutilizadas ou recicladas. O sistema é simples, como já era no Brasil antes de optarmos pela comodidade: há um depósito a ser pago, de mais ou menos R$ 0,25 sobre cada garrafa comprada, não interessando onde foi adquirida. Depois de vazias, o consumidor pode entregá-las em postos de coleta. Todo supermercado, por exemplo, recebe garrafas de volta. Ao devolvê-las, o consumidor recebe um ticket referente ao valor das garrafas devolvidas, que pode ser usado para comprar qualquer produto, não sendo necessário adquirir a mesma bebida para poder ter o “direito” de devolver as garrafas. Isso é eficiente, funciona. Por que nós não fazemos? Preguiça e descaso com o meio-ambiente. O Brasil é um dos países com os mais altos índices de reciclagem de latas de alumínio, o que é louvável. Infelizmente não temos este alto índice de reciclagem por conta de nossa consciência ecológica, mas sim pela miséria que faz com que os mais pobres entre os pobres desesperadamente catem latas por todos os cantos.  O ideal seria continuar reciclando, sem a necessidade de se apoiar na miséria, mas por consciência de que assim causaremos menos prejuízos ao planeta. Por falar em embalagens: aqui o leite e os sucos vêm em garrafinhas de plástico ou mesmo em caixinhas de papelão com parede interna revestida de plástico (mas não com alumínio, como acontece nas terríveis embalagens tetra pak, que causam alergia a quem tem hipersensibilidade a este metal), os produtos permanecem refrigerados e têm uma validade de cerca de 15 dias.

A conscientização da população em relação à limpeza também tem um forte apelo: o turismo. Grande parte da entrada de dinheiro no país vem dos turistas americanos e europeus. Todo mundo sabe que quase ninguém viria para cá se as praias estivessem sujas e as águas poluídas. As redes de água e esgotos aqui são bem estruturadas. A água distribuída é potável e em grande parte vem do mar, passando por processo de dessalinização. O esgoto é tratado e devolvido, através de emissários, em pontos no alto-mar, a boa distância da costa. Há cerca de 30 anos não era assim, mas que esta medida fez com que as águas das praias azul-turquesa desta partezinha do Caribe, assim como se vê em filmes, ficassem totalmente limpas. Em Bridgetown há um pequeno braço de mar que adentra a cidade e serve de atracadouro. Ao contrário do que se possa imaginar, as águas lá são transparentes, sendo possível ver peixes quando se está parado em alguma das pontes que a cruzam.

Aqui ocorre um debate interessante na mídia sobre um tipo de poluição geralmente ignorado por nós brasileiros: o país inteiro está discutindo uma nova lei sobre poluição sonora, que o governo implantará em breve. Em termos gerais, há bastante barulho, especificamente nas vias principais de Barbados, mesmo que a ilha seja um lugar bastante tranqüilo e silencioso. As pessoas adoram berrar para chamar a atenção de conhecidos que estão passando, as vans e os ônibus particulares têm sistemas de som infernais instalados, que o dia todo tocam músicas locais, a buzina é um dos acessórios mais usados no carro, algumas igrejas usam sistemas de som externo durante seus cultos.

Nos jornais freqüentemente há artigos que tratam de questões ambientais, mostrando que o assunto faz parte do dia-a-dia e é de interesse e preocupação da população como um todo. Talvez o tamanho do país também faça esta necessidade de preservar saltar aos olhos, pois se as pessoas começassem a destruir, não haveria muito que destruir, ao contrário do imenso Brasil, onde alguns milhares de hectares desmatados são só uma pequena mancha visível nas imagens de satélite, fazendo com que estas questões nos pareçam distantes e pouco importantes.

A companhia telefônica daqui lançou uma linha chamada “The Green Line”, totalmente operada por computador, funciona com mensagens gravadas. Ela é gratuita e dá informações de como os cidadãos podem dar destinação correta a diferentes tipos de materiais, como p. ex., o que fazer com carros e aparelhos domésticos  inutilizados, com lixo tóxico, baterias etc., indicando os locais corretos de entrega, além de dar informações de como fazer um local de decomposição de lixo orgânico em casa, de quais são as leis ambientais e as normas sanitárias do país, de como fazer denúncias e quais as companhias e grupos comunitários que são “environmentally-friendly”. O acesso à informação é fundamental.

Mesmo que ainda demandem melhoras, as atitudes do governo e dos cidadãos de Barbados em relação ao meio-ambiente podem fornecer bons exemplos para que nós também cuidemos do nosso país, abençoado por Deus, bonito por natureza, mas vítima de desleixos praticados por muitos de nós.

 

 
* O autor reside em Barbados, nas Índias Ocidentais, desde 2005. Marco Aurelio Schaumloeffel já viveu  no Gana, África Ocidental (de 2003 a 2005) é mestre em lingüística (UFPR), graduado em português, alemão e literatura e professor (leitor brasileiro) na University of the West Indies, enviado pelo MRE/Itamaraty. Além de livros e artigos nas áreas de lingüística, português, alemão, história e cultura brasileira, o autor também já redigiu artigos com temáticas ambientais para o website da ONG Curupira Ambiental, da qual é membro. Para obter mais informações sobre Barbados visite o site www.schaumloeffel.net e clique em “The Barbados Blog”. E-Mail para contato: marco@schaumloeffel.net

Source: Marco